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IA ACELERA PROCESSOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, AVALIAM GESTORES



Com foco na discussão da utilização da inteligência artificial na administração pública e seus impactos, o II Congresso Nacional de Gestão Pública contou com um painel que teve como palestrantes o secretário de Administração de Goiás, Francisco Sérvulo Freire, o secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Distrito Federal, Leonardo Reisman e o consultor legislativo do Senado Federal, Victor Marcel, com mediação da mestra em administração pública Andrea Ribas.

O primeiro a expor foi Sérvulo, que trouxe os desafios da administração pública diante da inovação trazida pela inteligência artificial. Ele fez todo um histórico do início do desenvolvimento da tecnologia e ponderou o impacto que ela terá no mercado de trabalho e no poder público.

Para Sérvulo é incontestável a contribuição que a inteligência artificial desenvolve na busca pela eficiência no setor público. “A inteligência artificial aumenta a eficiência dos processos de trabalhos repetitivos, que demandam tarefas iguais. Aqueles que não tem grande contribuição de aporte de conhecimento já estão sendo substituídos”.

Além disso, melhora a prestação do serviço público, com aperfeiçoamento de leis e políticas públicas. “Há uma dificuldade de quem faz política publica compreender as reais necessidades da população beneficiada. O uso extensivo das informações facilita a identificação e as demandas por leis mais aderentes às necessidades. Há melhoria da comunicação e engajamento entre o setor público e a sociedade, aumenta a capacidade de processamento, a velocidade e a qualidade do serviço entregue”.

O secretário destaca que com o volume de informações, a capacidade de predição trará soluções poderosas. “Soluções capazes de fazer diagnósticos com 90% de confiança. Hoje a confiança de um médico é de 60%. Posso fazer aplicação dessas soluções para segurança pública, identificação de pessoas que estão com mandado de prisão, apreender veículos que estão com desvio de mercadoria. As predições se baseiam em soluções que cruzam imagem, áudio, dados. Mas é importante destacar que a predição é influenciada por vieses e informações disponibilizadas pelos algoritmos. Temos, como gestores públicos, que enfrentar também esse desafio”.

Todavia, outro desafio precisa ser enxergado, que é a de substituição do trabalho humano. Previsão feita pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que 44% das ocupações devem ser substituídas por inteligência artificial.

“Isso trará efeito na renda das pessoas. O processo de crescimento ao longo do tempo, substituição dos postos de trabalho, adoção de novas tecnologias criam cadeias produtivas, novas ocupações. Estudo feito por economistas mostram que dos anos 80 para cá a criação de novas ocupações não tem sido superior a redução das ocupações existentes. A economia tende a ser desacelerada pela substituição das vagas de trabalho”. 

Sérvulo analisa que as novas ocupações deverão ter uma complexidade bastante alta, capazes de demandar níveis de conhecimento e capital humano que a maior parte dos países não possuem. “No Brasil temos deficiência de nível médio e fundamental, como enxergar novas ocupações se hoje a mão de obra não corresponde a tarefas exigidas exigida pelo mercado de trabalho. O Poder Público precisa pensar políticas públicas para que a população não fique marginalizada perante a mudança”.

O secretário de Administração de Goiás considera que ainda existem problemas a serem resolvidos para a implementação da inteligência artificial no setor público como o volume de recursos, que é alto, a falta de mão de obra qualificada e a questão ética do uso extensivo da tecnologia, principalmente no poder decisório.

Por outro lado, cabe ao setor público, conforme orientações diretivas da OCDE ser o grande financiador e investidor para estimular novas tecnologias e startups, ser um codesenvolvedor, se responsabilizando pelo desenvolvimento de soluções voltadas às políticas públicas e pelas informações produzidas. O gestor ainda ressalta a necessidade de regulação do uso da inteligência artificial.

“Não podemos ter a ingenuidade nesse mundo competitivo da possibilidade benéfica, mas também pode ser usado de forma maléfica, como nas fake news, nos cibercrimes, por isso o poder público deve ser o grande regulador do uso dessa tecnologia.

Pensando no impacto que a inteligência artificial pode ter no serviço público foi que o Governo do Distrito Federal criou um centro de governança múltipla, no qual as secretarias encaminharão os problemas específicos e os pesquisadores, junto com startups pensarão soluções parametrizadas.

Conforme o secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do DF, Leonardo Reisman, a medida foi pensada porque o governo se cansou de receber soluções prontas, sem nunca ser ouvido em suas dores.

“Somos Inundados de soluções tecnológicas para problemas inexistentes. Estamos recebendo propostas de soluções prontas. O único caminho, falando de inteligência artificial, são as encomendas tecnológicas. Ao invés de termo de referência com solução pronta, você vai enquanto secretaria dizer qual é o seu problema.  A partir dos problemas, criamos um modelo de contratação de inovação que dará conta disso. Não adianta falar de grandes avanços de transformação digital no estado, se não muda o arcabouço contratual”, salientou.

Reisman acentuou em sua exposição que a regulamentação do uso de dados é extremamente necessária e defende que ela seja feita pelo grau de risco que representa.

“A discussão mais importante é como regular. A resposta é eu não sei, mas a tentativa de regular a partir do risco, quanto mais arriscado a recomendação da inteligência artificial, mais transparente ela deve ser. Carros autônomos, por exemplo, precisam ser um sistema alvo de olhar estatal, de uma agência central ou estadual e municipal, exige acompanhamento do detalhe. Quanto mais risco, mais transparência, mais controle e fiscalização”.

Para o consultor legislativo do Senado Federal, Victor Marcel, não há dúvidas de que o potencial do uso da inteligência artificial é “tremendo” e pode modificar a forma como a administração pública acontece no cotidiano, otimizando processos. Ele cita como exemplos o próprio Senado, que já adota mecanismos até mesmo para a elaboração de requerimentos simples e transcrição de áudios.

Marcel não acredita que os profissionais serão substituídos pela inteligência artificial, mas pondera que a mão de obra precisará estar mais qualificada, por isso recomenda que as pessoas se familiarizem com as tecnologias já disponíveis – em sua maioria gratuitas.

“Estejamos atentos. A inteligência artificial chegou, vai mudar a forma como trabalhamos sobre todas as coisas. Vejam soluções para saber como pode facilitar nosso dia a dia, criar soluções que atendam ao poder público”.

 

Marco Regulatório

O consultor legislativo do Senado abordou o processo regulatório que está em tramitação no Senado Federal. Lembrou de que o processo foi discutido por uma comissão de juristas no ano de 2022, entre os meses de abril e dezembro, e que o relatório do trabalho originou o projeto de lei 2338/2023, de autoria do presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD/MG).

“Muitas empresas têm o receio de que a regulação seja pesada, que dificulte o desenvolvimento tecnológico. O desafio é encontrar o equilíbrio do modelo regulatório que existia, com nada de regras fortes, sem sanções, sem autoridade controladora, sem regime de governança. O projeto traz um modelo de regulação mais forte. O estado da arte da discussão sobre a futura lei da inteligência artificial é estabelecer uma lei que consagre alguns direitos do cidadão afetado por aquele sistema, não só pelo poder público, mas pelas empresas privadas também”.

Ele ainda explicou que o projeto de lei se espelha no que a União Europeia já faz há 6 anos, fazendo uma classificação pela geração de risco. Quanto mais risco, uma série de obrigações como transparência, relatórios são exigidas. Também existe a figura de um órgão regulador, transversal.

“É preciso ter uma visão plural. A tecnologia é a mesma, mas impacta de modo diferente as pessoas com menos recurso. Precisamos estar atentos quando utilizarmos essas soluções, pensarmos para quem estamos aplicando, qual população trato, o que isso significa para essas pessoas e como elas podem ser tratadas como pessoas e não como objetos da tecnologia”.


Jornalista: Mauro Camargo /Michely Figueiredo

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